Por que implantações de sistemas
de gestão são tão traumáticas? Por que tantas empresas chegam ao final do
projeto com a sensação de que a implantação não atendeu às expectativas? Por
que os orçamentos estouram? Nesse artigo eu apresento algumas armadilhas que
devem ser evitadas.
Nos últimos 28 anos eu estive
envolvido com implantações de sistemas empresariais, como os sistemas ERP ou
CRM. Já fui cliente, já fui fornecedor, hoje sou consultor. Posso dizer que
conheço as implantações de sistemas por todos os pontos de vista possíveis, e
isso talvez me permita uma análise isenta. Nesse curto artigo minha intenção é
passar um pouco dessa experiência, principalmente para quem está na condição de
cliente, ou seja, selecionando um sistema, já implantando, ou que já tenha
passado por uma implantação e não está satisfeito com os resultados. Abaixo as armadilhas
que se deve evitar:
1. Processo
de seleção inadequado. O
importante aqui é entender que quem está do outro lado é um vendedor, que
recebe comissão, tem meta e tem toda uma argumentação de vendas bem delineada
em lindos slides de Powerpoint. É preciso assumir a rédea da seleção,
identificando questões importantes e verificando a aderência do sistema. As
questões vitais do processo da empresa precisam ser validadas nas apresentações
dos módulos do sistema ou vistas funcionando em outros clientes. Visitar ou
contatar outros clientes é item obrigatório. Nunca compre um sistema de gestão
baseado apenas no discurso do vendedor.
2. Enxugar
demais as horas. A seleção
do sistema já está adiantada. Chega a hora da negociação. O gestor da empresa
diz “-deixa comigo” e parte para tentar baixar os custos. O risco aqui é a
conversa entrar pela redução das horas estimadas para implantação. É normal
discutir taxa/hora dos implantadores, valor das licenças, prazo de pagamento,
etc. Mas reduzir as horas estimadas para a implantação não faz sentido, pois
fazendo isso você está reduzindo o que vai ser entregue. Tentando comparar,
seria como entrar numa pós-graduação de 650 horas e pedir um desconto para
fazer apenas 500 horas. O escopo do projeto é uma questão eminentemente
técnica. Deixe para negociar as questões comerciais.
3. Deixar a
coordenação com a área de TI. Uma
implantação de um sistema de gestão afeta profundamente os processos da empresa
e, principalmente, afeta profundamente o dia a dia dos funcionários. Sendo mais
claro: É um evento estressante, que mexe com egos, inseguranças e toda a
estrutura de poder da empresa. Para conduzir esse processo é preciso um
coordenador com cacife pra lidar com conflitos, resistências ou até substituir
pessoas. O pessoal de TI tem um papel fundamental nas implantações, mas o
coordenador do projeto deve ter o nível hierárquico igual ou superior a todos
os usuários envolvidos.
4. A
replicação dos processos antigos no novo sistema. É fácil cair nessa armadilha. Talvez seja a
mais comum. Como a fase de levantamentos tende a ser baseada na avaliação da
aderência do sistema aos processos, ao final se tem um projeto que te levará a
implantar seus velhos processos no novo sistema. Não está errado, mas é uma
tremenda perda de oportunidade. Imagina passar alguns meses virando sua empresa
de pernas pro ar, e no final terminar com os mesmos processos. As apresentações
do sistema não devem ser vistas só pela ótica da aderência, mas também pela
ótica das oportunidades de melhoria. Consultores externos ajudam muito nisso.
5. Minha
empresa é diferente. Acho que
já ouvi essa frase uma centena de vezes. E esse pensamento leva à armadilha do
excesso de customizações, que encarece bastante a implantação e leva a uma
perigosa personalização do sistema. Todas as solicitações de customização
deveriam passar por uma análise criteriosa. Será que não estamos nos apegando a
um processo antigo? Será que o sistema não tem outra forma de tratar essa
questão? Será que a forma nativa do sistema tratar essa questão não é até
melhor que a forma atual? Considere a customização do sistema como a última
alternativa, algo que deveria ter a aprovação do presidente da empresa.
6. Excesso
de migrações de dados. Essa é uma
questão simples. É possível migrar cadastros de clientes, fornecedores,
produtos, etc., do sistema antigo para o novo. Ok! Mas... ao migrar você está
inserindo dados diretamente no banco de dados, sem que essa inserção passe
pelas críticas e validações das respectivas telas de cadastro. A dica aqui é,
se o cadastro não for gigantesco, cadastre manualmente. O cadastro das tabelas
acaba sendo uma atividade que familiariza o usuário ao sistema, além de
garantir a integridade dos dados.
7. Achar que
treinar o usuário é suficiente. A
implantação começou. O técnico da empresa fornecedora visita a empresa, senta
do lado do usuário e mostra como funcionam as telas do sistema. No final do dia
ele vai embora com a sensação de dever cumprido. O papel do implantador é esse:
Instalar, parametrizar e ensinar a usar. Se a empresa vai usar o sistema é
outra conversa. É muito comum o usuário ser treinado no sistema novo, continuar
a usar o sistema velho e ainda por cima esquecer o treinamento. Lembra daquelas
horas previstas no escopo do projeto? É por aí que a coisa desanda... É preciso
ter uma forte coordenação interna. O sucesso de uma implantação de sistemas de
gestão depende muito mais do cliente do que do fornecedor, ou... O fracasso de
uma implantação sistemas de gestão é muito mais responsabilidade do cliente do
que do fornecedor.
8.
Tentativas insanas de rodar dois sistemas em paralelo. Hoje eu acho que isso é até pouco comum. Mas não
custa alertar. Algumas empresas tentam rodar o novo sistema em paralelo com o
sistema velho como forma de validação. Isso parece fazer sentido... mas imagina
todo o movimento da empresa sendo feito duas vezes. Quem tem tempo para isso? O
que acontece na prática é que o “paralelo” atrasa e com isso não se conclui
nada. Para piorar, o projeto cai em descrédito. Substitua o “paralelo” pelo
“laboratório” onde cada transação é testada e validada pelos usuários. Se as
transações são validadas no laboratório, é de se esperar que ocorram de forma
correta após a partida do sistema. Reforçando: O usuário tem que ser o
principal executor/validador do laboratório. Assim, quando o sistema entrar no
ar, é o “dele" que está na reta.
9. Manter
controles fora do sistema. O estoque
foi implantado, mas o almoxarife tem lá suas anotações numa ficha kardex. O
financeiro já está no sistema, mas ainda tem um controle paralelo no Excel.
Essa é uma tremenda armadilha, pois no final o sujeito ainda diz que o
“sistema” dele é mais confiável. Sistema confiável é o que está sendo usado,
pois é com o uso que rotinas e dados são depurados. Se o almoxarife confia mais
no kardex, logo os saldos do sistema estarão errados. Lembra do “coordenador
que tem cacife”? Hora dele entrar no circuito e botar todo mundo para usar o
sistema.
10.
Implantação que degenera com o tempo. Isso é
relativamente comum, até esperado. O projeto acabou. A equipe retoma a rotina e
o coordenador é alocado em outros projetos. Se tudo correu bem, o projeto ficou
dentro do orçado. A atenção da empresa volta para as rotinas básicas – comprar,
produzir, vender, entregar, receber... e o sistema vai sendo incorporado ao dia
a dia. Com o tempo a implantação degenera. Os cadastros ficam bagunçados,
surgem erros, controles paralelos... A dica aqui é não desmobilizar totalmente
a estrutura do projeto. É importante entender que a implantação não acaba, o
que acaba é o projeto inicial. O sistema segue vivo como ferramenta de uso da
empresa e, principalmente, como ferramenta que possibilita novas evoluções dos
processos. E essa manutenção da evolução do sistema tem custo. Talvez o
vendedor não te diga isso, mas tem. E eu estou te avisando: Considere isso no
orçamento.
O acompanhamento de um consultor
externo pode ajudar a empresa a desviar dessas armadilhas e a obter melhores
resultados nas implantações. Consultoria não é necessariamente caro. Caro é não
ter retorno nos seus investimentos em implantação de sistemas.
Se esse assunto te interessa, entre em contato para uma conversa sem compromisso.